Opinião

A demolição e consequente reconstrução das Torres da Torraltinha

ANTÓNIO GUEDES DE OLIVEIRA
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Era uma chaga que se erguia no ar e que teimava em perdurar e atravessar sucessivos executivos. Com o seu esqueleto ao alto, ia desafiando verões e as demais estações que, ano após ano, deixavam as suas marcas. E já lá vão cerca de cinquenta anos que se viram erguidas no ar e que, contra ventos e marés, teimavam em desafiar o tempo. E, assim, as torres Crotália, como tecnicamente eram conhecidas, lá se iam aguentando e desafiando todos quantos passavam por si.

Foram muitos os anúncios da sua demolição e do nascimento de uma nova urbanização condizente com os pergaminhos de uma Costa d´Oiro que culmina no esplendor da Ponta da Piedade. Mas os anos iam passando e aquele esqueleto, como ferida na paisagem, lá se ia aguentando. E chegou até aos dias de hoje.

Agora, só se aguenta no ar, à espera de uma última demolição, uma réstia dessa construção que chegou até aos dias de hoje. E todos os que viam essa mancha erguida pelo ar fora, num dos espaços mais emblemáticos de Lagos, em termos paisagísticos e ambientais, começaram a respirar à espera de uma área preservada e enriquecida por uma nova urbanização que viesse suceder a esta demolição.

Mas apesar de tudo o que tem vindo a ser apregoado e difundido, aquela demolição vai dar lugar a uma construção em tudo semelhante ao que lá existia e que mexia com a sensibilidade de um ambiente e de uma paisagem que se querem preservados e valorizados pela acção e pela mão do homem. É o que nos diz toda a informação afixada nos taipais a difundir e a anunciar, em jeito de publicidade, o que de lá vai sair.

  • Esqueleto no ar
  • E perante um quadro com este desenlace, é caso para se perguntar por que é que se esperou cerca de cinquenta anos para tudo se perpetuar e para se continuar a agredir e a ferir uma paisagem tão emblemática e com uma beleza como aquela. Parece que estamos a regredir e a cometer os mesmos erros de há quarenta ou há cinquenta anos atrás. É comum dizer-se que nos tempos em que vivemos era impossível cometer-se erros como os que foram cometidos na praia da Rocha.

    Mas o que estamos a ver nas torres da Torraltinha é do pior que já vimos, em décadas atrás, pelo Algarve adiante e que o mancharam e lhe roubaram a qualidade e a especificidade natural que esta região requer e pode oferecer. Não se compreende como é que, nos dias de hoje, num território de excepção, se permite a construção de dois edifícios de dez pisos a manchar e a roubar a beleza a uma zona como aquela.

    Perante situações como esta, pergunta-se que eficácia tem os planos directores municipais quando são desenhados e orientados em favor de casos pontuais em vez de obedecerem a uma ideia de cidade que tenha como fio condutor a sua identidade. O mundo da construção faz parte da nossa economia e deve ter a sua actividade e a sua vitalidade próprias. Mas não se pode hipotecar a identidade de uma cidade ao mundo da construção que dita as suas regras e a sua evolução. E Lagos é uma cidade que se está a abastardar porque a sua identidade não se está a preservar.

    Do espaço das Torres da Torraltinha poderia nascer uma urbanização que embelezasse a área e contribuísse para a sua valorização. Mas aquelas torres ao alto, como esqueletos no ar, são apenas substituídas por outras com cara lavada e outra fachada. E com decisões como estas não obtemos qualquer valorização nem contribuímos para o bem comum. E Lagos fica a perder na sua globalidade e ainda mais uma zona com o valor emblemático da Ponta da Piedade.

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